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O Marco Legal das Startups

Updated: Jul 5, 2021



Startups são empresas fortemente marcadas pelo perfil inovador e tecnológico e, geralmente, dedicadas a desenvolver novo produto ou serviço que possa ser replicável e escalável. E é exatamente esse perfil inovador que proporciona as principais características de uma startup: um negócio com alto potencial de crescimento e alto risco. Trata-se de um segmento que, apesar do risco inerente (ou até por conta disso) é capaz de desenvolver novos mercados e impor mais dinamismo à economia.


Num cenário econômico cada vez mais incerto e com um ambiente regulatório em que até empresas já estabelecidas enfrentam entraves e dificuldades (aí incluídos a burocracia e os custos para constituição de empresas, o complexo sistema tributário e os elevados encargos trabalhistas), os riscos ao desenvolvimento de startups se potencializam. É crucial, portanto, que se incentive o empreendedorismo e se busque facilitar o desenvolvimento de startups.


Nesse contexto, o Marco Legal das Startups é iniciativa a ser comemorada. O Projeto de Lei Complementar nº 146/2019, proposto pelo Deputado Federal João Henrique Holanda Caldas (PSB/AL) e relatado pelo Deputado Federal Vinicius Poit (Partido NOVO) foi aprovado pela Câmara dos Deputados no final de 2020. Recentemente, foi aprovado por unanimidade pelo Senado (com alterações), devendo, portanto, ser votado novamente pela Câmara dos Deputados para posterior sancionamento pelo Presidente da República.


Embora tenha como objeto aprimorar o ambiente de negócios para empreendedores e incentivar a criação de startups, quais são os impactos e mudanças que o Marco Legal das Startups traz para empresas, investidores, empreendedores e para o ecossistema de inovação?


O texto do Marco Legal das Startups estabelece definições de conceitos comumente abordados no universo de empreendedores e investidores de startups, mas que careciam de regulamentação.


1. Enquadramento como Startups: passam a ser consideradas startups "as organizações empresariais ou societárias, nascentes ou em operação recente, cuja atuação caracteriza-se pela inovação aplicada a modelo de negócios ou a produtos ou serviços". Podem ser empresários individuais, empresas individuais de responsabilidade limitada, sociedades empresárias, cooperativas e sociedades simples, desde que atendam aos seguintes requisitos:


(i) receita bruta de até R$ 16.000.000,00 (dezesseis milhões de reais) no ano-calendário anterior ou de R$ 1.333.334,00 (um milhão, trezentos e trinta e três mil trezentos e trinta e quatro reais) multiplicado pelo número de meses de atividade no ano-calendário anterior, quando inferior a 12 (doze) meses;


(ii) com até 10 (dez) anos de inscrição no Cadastro Nacional da Pessoa Jurídica (CNPJ) da Secretaria Especial da Receita Federal do Brasil do Ministério da Economia; e


(iii) declaração em seu ato constitutivo ou alterador e efetiva utilização de "inovação", conforme definida na Lei de Inovação (Lei nº 10.973/2004, Art. 2º, inciso IV) ou enquadramento no regime especial Inova Simples (Lei Complementar nº 167/2019).


A definição e critérios de enquadramento não ficaram imunes a críticas, já que alguns entendem que a cultura inovadora da empresa conta mais que tempo de existência ou faturamento. Considerando que o objetivo é incentivar a criação, desenvolvimento e investimento em empresas nascentes e inovadoras, tanto a definição quanto os critérios de enquadramento parecem acertados.


2. Investidor-Anjo: no âmbito do Marco Legal das Startups, investidor-anjo é aquele investidor que não é sócio nem tem qualquer direito a gerência ou a voto na administração da empresa, não responde por qualquer obrigação da empresa e é remunerado por seus aportes.


As figuras do investimento-anjo e do investidor-anjo passam a se aplicar às Startups, com impacto positivo para o ecossistema do empreendedorismo, uma vez que trazem a segurança jurídica de que esse tipo de investidor não responderá por dívidas (inclusive em recuperação judicial) e não será responsável por nenhuma obrigação da startup (inclusive sobre dívidas trabalhistas).


3. Sandbox Regulatório: o texto do Marco Legal das Startups cria a possibilidade da administração pública estabelecer "condições especiais simplificadas para que as pessoas jurídicas participantes possam receber autorização temporária dos órgãos ou das entidades com competência de regulamentação setorial para desenvolver modelos de negócios inovadores e testar técnicas e tecnologias experimentais, mediante o cumprimento de critérios e de limites previamente estabelecidos pelo órgão ou entidade reguladora e por meio de procedimento facilitado."


Na prática, órgãos e entidades da administração pública poderão lançar projetos específicos, criando um ambiente regulatório experimental (o chamado sandbox regulatório), afastando a incidência de determinadas normas e regulamentos, visando a incentivar determinada startup ou grupo de startups, com foco no propósito pretendido.


A iniciativa é, em princípio, saudável, mas a efetiva implementação dependerá de cada projeto específico. O risco nesse aspecto é a possibilidade de intervenção da administração pública, beneficiando determinados setores em detrimento de outros.


4. Contratação pelo Estado: no âmbito da administração pública, o Marco Legal das Startups cria uma modalidade especial de licitação para contratação, pelo Estado, de soluções inovadoras desenvolvidas ou a ser desenvolvidas por startups. A modalidade especial prevê que o escopo da licitação poderá se limitar à indicação do problema a ser resolvido e dos resultados esperados pela administração pública, ficando dispensada a descrição de solução técnica previamente mapeada e suas especificações. Mais de uma startup poderá ser contratada em uma licitação se houver previsão expressa no edital, desde que não ultrapasse o valor de R$ 1.6 milhão por contrato.


Além da aplicação mais flexível do critério de preços (economia do dinheiro público), o julgamento das propostas levará em consideração o potencial de resolução do problema pela solução proposta e o grau de desenvolvimento, maturidade e viabilidade econômica dessa proposta, em adição à demonstração comparativa entre o custo-benefício da proposta da startup e das empresas consolidadas que também se manifestaram.


Caso a proposta seja aprovada, a administração pública firmará o chamado Contrato Público para Solução Inovadora (CPSI), que terá duração de um ano, com possibilidade de prorrogação em igual período. O CPSI poderá prever o adiantamento de valores para o custeio da solução tecnológica proposta pela(s) startup(s) selecionada(s), com a garantia de reembolso dos custos incorridos.


Encerrado o prazo do CPSI, a administração pública poderá contratar com a(s) startup(s), sem licitação, o fornecimento da solução desenvolvida.


5. Sociedades Anônimas: o Marco Legal das Startups procurou simplificar a Lei das SAs para possibilitar que essas sociedades possam ter apenas um diretor, possam publicar suas demonstrações financeiras e legais na internet, ao invés de versões impressas, e possam substituir seus livros contábeis por registros eletrônicos.


6. Stock Options: o texto do Marco Legal das Startups aprovado originalmente na Câmara dos Deputados previa a possibilidade de subscrição de ações para empregados das startups. A ideia, com essa possibilidade, era promover uma melhora nas relações trabalhistas, incentivando o interesse dos empregados no sucesso das startups e permitindo a retenção de talentos sem aumentar o custo com remuneração.


De acordo com a Agência Senado, o relator, Sen. Carlos Portinho retirou essas disposições do Marco Legal das Startup porque o assunto, apesar de relevante para startups, não seria restrito a elas. Para não atrasar a aprovação do projeto, já que esse tema foi objeto de emendas de vários senadores, ele teria se comprometido a apresentar outro projeto de lei sobre o tema no futuro próximo.


7. Benefícios Fiscais: no que diz respeito às questões fiscais, o texto esclarece que será permitido às empresas o desconto do valor aplicado no FIP-Capital Semente da base de cálculo do Imposto de Renda da Pessoa Jurídica. O gestor do fundo de investimentos controlará, acompanhará e examinará a prestação de contas das startups que utilizarem desse benefício.


O Marco Legal das Startups volta para a para Câmara dos Deputados para apreciação das alterações implementadas no Senado. Aprovado, segue para sanção presidencial.


A percepção é de que o Marco Legal das Startups, ainda que represente um avanço, poderia ter sido mais ousado, já que deixou de fora da regulamentação aspectos relevantes para o empreendedorismo.


De toda forma, trata-se de regulamentação que dará mais segurança e permitirá o crescimento do mercado para startups, o que já reflete um avanço importante. Ademais, com a análise dos resultados obtidos com o Marco Legal das Startups, novas iniciativas poderão ser estudadas para aprimorar o ecossistema do empreendedorismo no Brasil.



Fernando Stacchini / Paola Lorenzetti / Gabriela Giacon

Equipe de Tecnologia, Propriedade Intelectual e Direito Digital - Motta Fernandes

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